Nota sobre a Medida Provisória 1.040

No dia 29 de março, o governo federal publicou a medida provisória 1.040, conhecida como MP do Ambiente de Negócios (MPAN). O principal objetivo da MPAN é impactar positivamente o desempenho do Brasil no Doing Business, ranking elaborado pelo Banco Mundial que avalia a facilidade de fazer negócios em 190 países. De acordo com as projeções do governo, a medida pode elevar o Brasil, que hoje está no 124º lugar, de 18 a 20 posições no ranking. Nesta análise, avaliamos o possível impacto da MPAN sobre o processo de abertura de empresas e apontamos as limitações das medidas para melhoria do ambiente de negócios que deixem de lado a reforma tributária.

Antes de discutir o mérito do texto da MPAN é importante ressaltar que, embora o envio dessas propostas via medida provisória seja positivo, visto os seus efeitos imediatos, há o risco de que elas percam a validade se não forem aprovadas pelo Congresso em 120 dias. A perda de validade gera a necessidade de regulamentações adicionais sobre seus efeitos em práticas e processos no período de vigência, e dessa forma potencializa a complexidade e a insegurança jurídica. Portanto, para que a MPAN alcance os seus objetivos, é de extrema importância que o governo se empenhe em transformá-la em projeto de lei por meio do diálogo com parlamentares, com os entes federativos e com os setores econômicos impactados com o texto.

Em relação à simplificação de processos de abertura de empresas, a MPAN pode gerar importantes avanços. Dentre eles, destaca-se a previsão da unificação das inscrições tributárias, que deixariam de ser realizadas por meio de pelo menos 4 procedimentos diferentes para serem efetivadas por meio de apenas 1, e por isso tem grande potencial de reduzir tempo e complexidade do processo. Embora de grande importância, a implementação desse dispositivo deve enfrentar dois desafios. O primeiro deles é a integração dos sistemas, em especial no nível municipal, para a comunicação dos registros emitidos entre entes federativos. O segundo é a adesão de estados e municípios. Apesar de a Medida Provisória não ser específica sobre a adesão obrigatória ou facultativa dos entes ao cadastro único, os princípios da subsidiariedade e a competência legislativa dos entes são resguardados pela estrutura federativa.

Outros dispositivos que devem gerar impactos positivos são: a dispensa da viabilidade de local, nos casos em que a oferta desta licença não for automatizada, e a criação de uma classificação e de procedimentos padronizados para empresas que exercem atividades de médio risco, no caso dos estados que ainda não possuem um tratamento específico para esse perfil de atividades. A automatização da emissão de licenças e a padronização da avaliação de risco dos negócios já foram listadas pela Endeavor como soluções para simplificação do processo de abertura de empresas e como alternativa para que os estados e municípios possam focar as atividades de fiscalização nas atividades econômicas de alto risco (para a saúde, o ambiente, dentre outros). Esses pontos serão responsáveis por gerar simplificação nos municípios com baixos níveis de automatização de processos e que ainda não trabalham com classificações de risco em três níveis.

A MPAN tem potencial de impactar positivamente a simplicidade, a transparência e a celeridade dos processos de abertura de empresas no país. Mas para que este gere o impacto almejado, as inovações trazidas pela medida devem ser implementadas de modo integrado aos demais procedimentos e comunicadas com clareza aos cidadãos interessados em abrir uma empresa, de modo a evitar retrabalho. Além disso, é essencial envolver os estados e municípios no debate sobre sua implementação, criando políticas que fomentem a adesão a essas medidas. Ou teremos apenas uma nova norma, que, na prática, não se desdobra em melhorias efetivas para o ambiente de negócios e para os empreendedores.

No entanto, quando se trata da melhoria efetiva do ambiente de negócios e da posição do Brasil no ranking Doing Business, seguimos sem endereçar o principal problema enfrentado por quem faz negócios no país: a dificuldade de pagar impostos. Este é, de longe, o nosso pior desempenho no ranking do Banco Mundial, em que figuramos na 184ª posição dentre 190 países – entre Congo (183º) e Guiné (185º).

O principal responsável por esse resultado é o injusto e ineficiente sistema de tributação sobre o consumo no Brasil. Isso fica evidente com o desempenho do país no indicador de horas gastas para o pagamento de tributos, uma das quatro dimensões tributárias avaliadas pelo Doing Business e que mensura a complexidade de um sistema tributário. O estudo estima que as empresas brasileiras gastam 1.501 horas por ano para apurar e pagar seus tributos – número quase cinco vezes superior à média da América Latina (317,1 horas/ano) e dez vezes superior à média da OCDE (158,8 horas/ano). Dessas 1.501 horas, 885 são dedicadas exclusivamente ao pagamento de tributos que incidem sobre o consumo (PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS).

Uma reforma tributária do consumo, que seja ampla (abrangendo tributos municipais, estaduais e federais) tem o poder de reduzir esse número em 600 horas, ou seja, 68% de redução no custo de compliance das empresas, como mostrou uma pesquisa da Endeavor e EY. Segundo uma análise do Itaú, existe uma correlação alta e positiva entre a qualidade do sistema tributário, o crescimento econômico e o nível de empreendedorismo em um país. Quanto melhor o sistema tributário, menores são os custos de transação e a insegurança jurídica. Por outro lado, mais negócios são abertos e formalizados, desencadeando crescimento econômico e aumento do PIB per capita a longo prazo (Fonte: Itaú, 2020).

Se queremos melhorar o ambiente de negócios brasileiro, a reforma tributária deve ser prioridade. A Comissão Mista da Reforma Tributária foi recentemente prorrogada e agora é essencial que seu relatório seja apresentado para que possamos dar o próximo passo desse tema tão relevante para os empreendedores, a população brasileira e o país.


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