O papel da Endeavor na corrida global por competitividade

Camilla Junqueira
Camilla Junqueira

Camilla Junqueira é Diretora Geral da Endeavor Brasil. Foi reconhecida pela revista Forbes como uma das mulheres mais poderosas do Brasil.

A semana começou com um vento de esperança entrando pela janela: o uso emergencial de duas vacinas contra o coronavírus foi aprovado e as primeiras doses já estão sendo aplicadas no Brasil. Sabemos que nosso caminho de recuperação ainda é longo. Porém, em meio às fissuras sociais, políticas e econômicas expostas pela pandemia, uma pergunta persiste: em qual direção devemos caminhar a partir de agora?

Nós estamos, neste exato momento, vivendo um ponto de inflexão.

Olhando para trás, celebramos tudo o que já foi conquistado. Em 20 anos de atuação da Endeavor no Brasil, vimos nosso ecossistema sair do ponto zero até sermos reconhecidos como uma nova e promissora potência, um dos mais prósperos ecossistemas da América Latina, ou talvez do mundo.

Hoje, uma nova geração de scale-ups inovadoras têm mostrado ao mundo do que o Brasil é capaz.

Um olhar pelo retrovisor pode nos fazer acreditar que a nossa missão está cumprida. O Brasil é hoje uma nação empreendedora. Porém, quando olhamos pra frente, ainda temos um horizonte a ser desbravado. Esse é o papel dos pioneiros: desbravar novos caminhos. E essa também é a nossa missão na Endeavor.

Nesse ponto de inflexão, vivemos o contraste entre o que somos e o que podemos ser, como mostram os dados a seguir.

O Brasil começa a entrar no radar como um país que produz inovação, berço de empresas capazes de competir globalmente, mas ainda temos um longo caminho para aumentar a nossa competitividade como país.

  • O valor de mercado das 10 maiores empresas de tecnologia do Brasil triplicou entre 2010 e 2019, passando de US$ 27 bilhões para US$ 86 bilhões, segundo dados da McKinsey, mas esse valor ainda é centesimal perto do tamanho das big techs.
  • Exemplo disso é que as empresas brasileiras de capital aberto, 350 companhias no total, valem cerca de US$ 800 bilhões, segundo dados da B3, enquanto a Apple, sozinha, vale mais do que o PIB do Brasil inteiro.
  • Formamos 16 unicórnios em 3 anos, mas apenas Beijing já tem 93 empresas com valuation superior a US$ 1 bilhão.
  • Somos o 6º pior país, entre 141, no Global Competitiveness Report 2019, do Fórum Econômico Mundial, quando avaliado o grau de distorção causado pelos impostos na competição entre os negócios.
  • O Brasil é um dos 10 piores países do mundo para pagar impostos no ranking Doing Business 2020, do Banco Mundial, ocupando o 184º lugar entre 190 países.

O contraste revelado acima também se reflete no momento de maturidade do ecossistema de Acesso a Capital no Brasil.

O boom na indústria de Venture Capital é uma excelente oportunidade, mas há muito espaço para crescer e ainda existem diversos desafios para que empreendedores consigam acessar mais (e melhor) capital.

  • 2020 foi um ano recorde em captação! Foram US$ 3,5 bilhões captados por startups e scale-ups brasileiras em 469 aportes, mesmo em meio à pandemia.
  • Ainda assim, o total investido em Venture Capital no Brasil é 50 vezes menor do que nos Estados Unidos, segundo os dados do Digital Transformation Report da Atlantico. Em Israel, o investimento em VC representa 0,99% do PIB, enquanto no Brasil ele corresponde a apenas 0,12% do total.

Esse cenário nos diz uma coisa: para o Brasil se desenvolver, diante de mais uma crise que atrasa nossas perspectivas de crescimento, nós sabemos a direção, mas precisamos de mais velocidade. Nós precisamos das scale-ups.

Como o nosso Chairman Rodrigo Galindo disse no Encontro Anual Endeavor,não estamos vivendo apenas uma nova era do empreendedorismo no Brasil, mas testemunhando um Brasil transformado pelo empreendedorismo”.

Em um cenário de volatilidade e incerteza, as regras mudam. Para percorrer a próxima fase, não temos apenas o desafio de lidar com as consequências da pandemia. Temos também um cenário global intensamente competitivo, a concorrência desproporcional das big techs e as amarras da complexidade tributária brasileira.

Por outro lado, o preparo dos empreendedores e das empreendedoras de alto impacto, capazes de atrair talentos e capital ao país, nos dá uma chance inédita nesse jogo.

É nesse contexto que definimos cinco principais pilares da atuação da Endeavor para os próximos anos:

1. Diante da competição desigual das big techs, formamos empreendedores e empreendedoras que crescem e multiplicam seu impacto

Desde o dia 1, nossa tese de impacto está centrada na capacidade que poucos empreendedores e empreendedoras têm em gerar um impacto desproporcional no ecossistema.

A tese é que esses empreendedores são verdadeiros exemplos, crescendo de forma acelerada e criando o que chamamos aqui de Efeito Multiplicador – fruto de uma combinação de duas características: scale-up & giveback.

Scale-up: Crescer é o maior indicador da relevância que uma empresa tem para a sociedade, gerando milhares de empregos, oportunidades, inovação, mobilidade social e riqueza para toda a sociedade.

São essas empresas que atraem talentos e capital estrangeiro para o ecossistema brasileiro, aumentando nossa competitividade no cenário global. A nova geração de unicórnios é um dos principais indicadores dessa competitividade.

  • Vemos no portfólio de Empreendedores Endeavor uma massa crítica de empresas que são grandes referências não só no Brasil, mas a nível global. Só em 2020, elas geraram mais de R$ 8 bilhões em receita, com um CAGR médio de 64% nos últimos três anos, e mais de 33 mil empregos.
  • Hoje, metade dos unicórnios brasileiros já passaram pela Endeavor. Seis deles são liderados por Empreendedores Endeavor – Movile, Ebanx, Loft, VTEX, Creditas e MadeiraMadeira – e dois unicórnios, Loggi e Gympass, já participaram de nossos programas de aceleração.
  • Ao longo dos anos, não só aumentamos a escala dos Programas Scale-up, saindo de 9 programas em 2016 para 25 programas e +230 empresas aceleradas em 2020, como estamos apoiando empresas cada vez maiores e com alto crescimento.
  • Juntas, as empresas do Scale-Up Endeavor faturaram mais de R$ 5 bilhões em 2020, em comparação com R$ 1,3 bilhão em 2015, e mais da metade delas cresceu +75% entre 2019 e 2020, em um ano em que o Brasil viveu uma de suas crises mais profundas.

Mas o crescimento dessas empresas só tem sentido se for acompanhado de impacto. Por isso temos nos provocado cada vez mais a usar essa força e influência para gerar real impacto no país. E por isso formamos empreendedores comprometidos com o giveback.

Giveback: Esse é o compromisso de cada empreendedor em multiplicar seu sucesso e sua influência ao mentorar, investir e inspirar outras gerações de empreendedores.

O resultado dessa combinação pode ser visto no exemplo de Florian Hagenbuch, Empreendedor Endeavor da Printi, da Loft e do Canary. Em menos de 3 anos, a Loft tornou-se referência entre as proptechs, atraindo fundos globais como Andreessen Horowitz, Fifth Wall Ventures e Vulcan Capital. Hoje a scale-up é conhecida como o unicórnio mais rápido do Brasil.

Mas o impacto de Florian transcende as paredes da Loft. Em 10 anos, desde a fundação da Printi em 2011, Florian já impactou mais de 180 startups e scale-ups no ecossistema investindo, mentorando e inspirando seus fundadores.

competitividade
Mapa de Impacto de Florian Hagenbuch. Veja outros Mapas clicando aqui.

Hoje, 90% da rede global de Empreendedores Endeavor multiplica seu impacto atuando como investidores, mentores e promotores ativos do empreendedorismo de alto impacto.

Em um cenário no qual a concentração das big techs é uma ameaça à competitividade global, são as scale-ups que colocam o Brasil no radar do mundo como um país produtor de inovação – e são seus empreendedores que multiplicam seu sucesso ao impactar as próximas gerações.

Mas, para essas empresas terem uma chance no jogo, elas vão precisar acessar mais (e melhor) capital.

2. Diante do boom da indústria de Venture Capital, facilitamos o Acesso a Capital para quem cresce

Em maio de 2017, a 99 recebia um aporte inédito de US$ 100 milhões do Softbank. A rodada foi um marco que levou o gigante japonês a olhar para a América Latina. Dois anos depois, o Softbank Vision Fund anunciava um aporte de US$ 5 bilhões nas scale-ups mais promissoras da região, o equivalente à soma total dos investimentos realizados nos dois anos anteriores. Era o início de uma nova era.

Em meio a esse tsunami de investimento, combinado também com a chegada de outros fundos, o Brasil tem nadado de braçada. Seis fundos locais realizaram captações recordes, mesmo em meio à pandemia, anunciando que ainda há muito capital para alocar em novas investidas.

Mesmo com esse cenário positivo, ainda temos obstáculos a superar. O maior fluxo de capital gera mais diluição aos empreendedores, prejudicando seu captable e colocando em risco seu crescimento no longo prazo. Além disso, em um país de dimensão continental, o fluxo de capital para scale-ups permanece altamente concentrado. Segundo estudo do Distrito, São Paulo concentrou 83% do total de investimentos de Venture Capital realizados em 2020, mesmo em um cenário em que tem surgido cada vez mais grandes empresas em outras regiões do Brasil. Metade dos unicórnios da Endeavor são de fora de São Paulo, por exemplo.

Por isso, nosso papel na Endeavor é expandir e facilitar o Acesso a Capital pró-empreendedor para as scale-ups brasileiras, o que envolve:

  • Apoiar as empresas aceleradas para que possam estruturar sua estratégia de fundraising, para encontrar a melhor fonte de capital para o seu momento, evitando a diluição excessiva dos empreendedores. O Endeavor Catalyst, nosso veículo global de co-investimento em Empreendedores Endeavor, já investiu em 29 empresas brasileiras em suas rodadas, 8 só em 2020. E as empresas aceleradas captaram mais de R$ 8 bilhões, considerando apenas as rodadas de 2020, representando mais de 40% do total de investimentos feitos no Brasil.
  • Envolve também usar os desafios da nossa rede para identificar temas para educar e preparar os empreendedores brasileiros para acessar o melhor capital. Só em 2020, nosso Mapa de Acesso a Capital, por exemplo, chegou a mais de 100 mil pessoas.
  • Produzir estudos e conteúdos para conscientizar os diferentes atores do ecossistema da importância de investimentos saudáveis e pró-empreendedor para o crescimento das empresas.

3. Diante da chegada de novos players no ecossistema, estimulamos a inovação aberta com scale-ups

Cinco hospitais construídos em 40 dias cada. Um produto testado nas gôndolas do maior varejista do país em poucas semanas. Um software que reduz de 1h30 para 10 minutos o tempo médio de uma operação. Esses são alguns exemplos dos resultados inéditos gerados pela colaboração entre corporações e scale-ups.

Em uma crise, a inovação aberta pode ajudar as organizações a encontrar novas maneiras de resolver problemas urgentes e, ao mesmo tempo, construir uma reputação positiva. E velocidade é uma característica das scale-ups.

Já está mais que provado que ecossistemas abertos e colaborativos geram mais inovação e crescimento para todos os envolvidos.

É por isso que a Endeavor tem feito um trabalho consistente nessa frente desde 2014, conectando corporações que têm uma estratégia de inovação mais madura com empreendedores à frente dos negócios que mais crescem no país.

Nesse período, já foram mais de 120 negócios gerados entre corporações e scale-ups, mais de 70 só em 2020.

Nosso papel é educar os dois lados da mesa para não só aumentar o volume, mas a qualidade nos negócios gerados. Queremos estimular que todo ecossistema enxergue os benefícios de fazer inovação aberta com scale-ups, em um ambiente favorável aos empreendedores.

Para a corporação, quanto mais entrepreneur friendly, melhor sua reputação e atração à frente das scale ups, acelerando seus resultados de inovação.

Para a scale-up, a corporação oferece acesso a mercado, capital, infraestrutura e conhecimento – que, sozinhas, levariam anos para obter – acelerando seu crescimento.

Um verdadeiro ganha-ganha.

Com mais capital e mais colaboração, nós aumentamos a chance do Brasil nesse jogo de competitividade global. Porém, nós ainda precisamos jogar num campo melhor.

4. Diante de um dos piores ambientes de negócio do mundo, articulamos medidas para simplificar o sistema tributário

De acordo com o Doing Business 2020, no Brasil são gastas 1.501 horas/ano por empresa para o pagamento dos tributos, valor 5 vezes maior que a América Latina e 10 vezes maior que a média dos países da OCDE.

A maior parte do tempo é gasta com tributos sobre o consumo (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS): 885 horas/ano. Sabemos que dá para ser muito diferente.

A partir do aprofundamento técnico no tema que tivemos nos últimos três anos, defendemos a aprovação de uma Reforma Tributária que simplifique a tributação sobre o consumo (bens e serviços), a partir de três pilares centrais: simplicidade, transparência e justiça.

Um Brasil depois da Reforma Tributária é um país mais simples para os empreendedores, mais transparente, e além disso, muito mais justo e com menos desigualdade.

Quando a complexidade do custo Brasil é eliminada, o crescimento é consequência natural.

5. Estimulamos o compromisso das scale-ups com a geração de impactos positivos na sociedade

O modelo de impacto da Endeavor se baseia na figura do exemplo.

Nossos empreendedores e empreendedoras já são referências no ecossistema, liderando o caminho e sendo responsáveis por criar novos padrões e tendências.

Todos os pilares mencionados acima são caminhos para a transformação do ecossistema, da economia e do país. Mas essa transformação só será efetiva se cada scale-up entender que o seu papel vai além de crescer, passando a incluir práticas de ESG (Environmental, Social and Governance) em suas empresas como uma forma de garantir sua responsabilidade em gerar impactos positivos na sociedade.

Nosso papel, como Endeavor, é estimular que as empresas coloquem ações em prática, mas cada uma dessas dimensões possui uma complexidade própria e precisamos fazer um trabalho efetivo na promoção de mudanças – o que implica priorizar por onde queremos começar.

Para isso, levamos em conta o nosso histórico de atuação e posicionamento global, além do momento do ecossistema, para começar com um compromisso mais firme com o tema de Diversidade & Inclusão.

Apesar de vários estudos atestarem que empresas mais diversas promovem mais retorno aos investidores, as empresas brasileiras no geral, incluindo as scale-ups, têm um longo caminho para, de fato, serem consideradas diversas e inclusivas.

  • No Brasil, as mulheres representam 51% da população, mas compõem apenas 6% dos times executivos –McKinsey, 2015e 8% de assentos em Conselhos –Deloitte, 2018.
  • Mais da metade da população brasileira (52,3%) é composta por não brancos, mas eles ocupam apenas 9% das posições em times executivos –McKinsey, 2015.
  • A participação de mulheres nos times de fundadores das 100 maiores startups brasileiras é de apenas 2% –McKinsey, Brazil Digital Report 2020.

Depois de 20 anos, a Endeavor segue desbravando caminhos no ecossistema para que mais empreendedores e empreendedoras cresçam e levem com eles todo o país.

Do lugar em que estamos, todo ponto de inflexão é uma oportunidade de escolha sobre a direção – e a velocidade – que decidimos seguir.

Podemos nos deter nas fissuras expostas pela crise, ou enxergar através delas, a infinidade de futuros possíveis que temos diante de nós.

Podemos lamentar os obstáculos que impedem o Brasil de avançar mais rápido, ou redobrar os esforços e fazer a nossa parte para virar o jogo.

Podemos, enfim, desanimar diante de tantos muros a serem quebrados, ou apoiar aqueles empreendedores e empreendedoras que estão erguendo um novo Brasil.

Essa é a escolha que fazemos, todos os dias, na Endeavor.

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